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O Visconde de Taunay e o Triângulo Mineiro em 1865
Críticas e Comentários
O Visconde de Taunay e o Triângulo Mineiro em 1865 - opúsculo que narra a presença do romancista Visconde de Taunay no Triângulo Mineiro, principalmente em Uberaba. Preciosa fonte de detalhes históricos. Publicado pela Academia de Letras do Triângulo Mineiro, em 1964.
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Um trabalho que honra o autor e a cidade. Jornal "Lavoura e Comércio", 20 de março de 1964
Um trabalho que honra o autor e a cidade
O primeiro caderno da Academia de Letras enfeixa, justamente, um trabalho do seu presidente, dr. José Mendonça, que nos apresenta aspectos de Uberaba e do Triângulo Mineiro em 1865, quando por aqui passou o Visconde de Taunay como integrante do corpo de oficiais - engenheiro da força expedicionária que realizaria depois a heróica "retirada da Laguna", que o próprio militar imortalizaria no seu famoso livro, hoje uma das obras clássicas de nossa literatura.
O dr. José Mendonça soube reunir vários episódios interessantes narrados por Taunay, que refletem bem os usos e costumes daqueles recuados tempos, quando a população desta cidade não contava mais de duas mil almas e as suas casas eram de "mesquinha aparência" e "quase sempre" de "pau a pique". E soube, também, acompanhar as observações de comentários felizes, retificando algumas, ampliando outras, no louvável esforço de proporcionar aos seus leitores uma visão fiel de Uberaba de cem anos atrás.
O sentido de justiça, principalmente, inspira o trabalho do presidente da nossa Academia de Letras, que refuta, vigorosamente, certos julgamentos que considera divorciados da realidade. Está neste caso, por exemplo, o conceito do autor de "Retirada da Laguna" e "Dias de Guerra e de Sertão", sobre um dos primeiros médicos desta terra.
"Não foi justo o Visconde de Taunay, procurando ridicularizar (nas "Memórias" e em outros livros, como veremos) a figura do Dr. Henrique Raimundo des Genettes (e não Desgenettes, como escreveu), um dos mais esforçados e brilhantes pioneiros da nossa civilização".
Além de justa, a atitude do dr. José Mendonça é profundamente simpática aos uberabenses, que consideram com respeitosa admiração as personalidades que marcaram a sua passagem pela história desta comuna, contribuindo com o seu esforço e seu espírito público para o engrandecimento coletivo e o bem estar de seu povo. E o dr. Henrique Raimundo Des Genettes está, inegavelmente, nesse número.
Quando o Visconde de Taunay passou por Uberaba, o antigo hospital da Santa Casa de Misericórdia estava em fase final de construção. O escritor, entretanto, não menciona o nome do responsável por essa obra verdadeiramente gigantesca na época em que foi realizada: - Frei Eugênio Maria de Gênova, o "Padres Mestre", inegavelmente o maior benfeitor de Uberaba de todos os tempos. O dr. José Mendonça, porém, no seu opúsculo, corrige essa falha, aliás das mais graves entre as apontadas nos livros do grande escritor patrício.
Outros e variados aspectos desta cidade e da região são focalizados de maneira sugestiva, com o carinhoso interesse que o dr. José Mendonça dispensa a todas as cousas de sua terra, oferecendo-nos uma autêntica Uberaba de 1865.
A verdade é que cadernos como esse honram o autor e enaltecem a Academia de Letras do Triangulo Mineiro, no seu patriótico empenho de defender o patrimônio cultural desta gente de Minas.
Jornal "Lavoura e Comércio", 20 de março de 1964
Taunay e o Triângulo. Jornal "Correio de Uberlândia", 12 de maio de 1964
Taunay e o Triângulo
"O Visconde de Taunay e o Triângulo Mineiro de 1865" é o titulo de um folheto em que José Mendonça enfeixa um punhado de informações sobre a nossa região, Uberaba principalmente, na segunda metade do século passado. O autor de "Inocência" esteve na vizinha cidade quando ali foi organizado o corpo expedicionário para a campanha de Mato Grosso contra os paraguaios, expedição que teve o seu epílogo na famosa retirada da Laguna, que forneceu assunto, como se sabe, a uma bela narrativa de Taunay.
Taunay era um observador penetrante e da sua estadia em terras triangulinas deixou vários episódios, que José Mendonça recolheu, dedicando a cada um deles comentários elucidativos e oportunos. As tropas da expedição permaneceram em Uberaba quarenta e sete dias, tempo mais que suficiente para que o escritor anotasse todos os costumes da população, todos os aspectos da urbe, criticando às vezes, com ironia pessoas e fatos. Assim, por exemplo, este registro das suas "Memórias": Até Uberaba, naquele ano de 1865, não havia sertão: todo o caminho tinha, ao longo, à direita e à esquerda, mais ou menos próximos, casas, habitações e rancharias. Nelas tomávamos refeições, às vezes bem abundantes e até de saboroso condimento, galinhas, ovos, lombo de porco, ervas à mineira, feijão cavalo, arroz e farinha de milho. A sobremesa, broas, bolos ou simplesmente rapadura, o que tudo pagávamos barato, mil e mil quinhentos ou dois mil reis por pessoa".
Como se vê, o então segundo tenente de artilharia da comissão de engenheiros, que se tornaria mais tarde em nobre do império e em membro fundador da Academia Brasileira de Letras prestava atenção ao cardápio sertanejo e deveria ser devoto da gastronomia. Mas deixemos que ele prossiga: "Freqüentemente, também, comprávamos a umas mulheres velhas, gordas e barrigudas, uma espécie de pães-de-ló ou então sequilhos e um biscoito feito com ovos e conhecido por "brevidade", de fato gostosos e que contingente da guarda nacional convocada pelo presidente de Minas Gerais. E acrescenta que chegaram a reunir-se cento e vinte, senão mais, cidadãos dispostos, na aparência, a arrastar todas as peripécias da guerra, e "só pelo fato da apresentação considerados outros tantos heróis, já imortais, pelo jornalismo mineiro". Mas as deserções sucederam à fanfarronice.
Continua Alfredo de Taunay o seu depoimento, segundo José Mendonça, agora citando des Genettes, que constituiu tema de uma crônica anterior publicada nesta coluna: "Os dois únicos que se mostravam indignados (refere-se à covardia da guarda nacional) e falavam a bandeiras despregadas, eram um tal cabo reformado, valentão que seguiu conosco e confirmou a fauna que granjeara, e aquele cirurgião, francês de nascimento e chamado Raymundo Desgenettes, parente, segundo pretendia, do célebre cirurgião dos tempos de Napoleão I. Figura puxando a ridículo essa do dr. Desgenettes, metido a revolucionário, desde que chegara ao Brasil. Envolvera-se ardentemente na revolução mineira de 1842 e, na batalha de Santa Luzia, era quem comandava a artilharia.
Médico de alguma clínica naquelas paragens, embora muito pago, tinha casa própria em Uberaba, e ligou-se bastante comigo, chegando até a levar-me a tomar chá com a família, composta de mulher e filha e, conforme o uso da terra, em extremo acanhada.
Nessa noite meteu-se a cantar ao violão uma modinha em dueto com a esposa e era de verdade a expressão cômica amorosa que os dois buscavam incutir no trecho musical, tudo acondimentado com chá de são Paulo, torradas e uns biscoitos secos e duros como calhaus. (...) Pobre Desgenettes! Parece-me ainda vê-lo. No dia da nossa partida de Uberaba, a cavalo, pequeno, magro, já grisalho, com os olhos esbugalhados, burlesca fardinha de capitão da guarda nacional e um boné notabilizado por enorme pala".
José Mendonça opõe embargos aos conceitos deprimentes que Taunay escreve sobre o médico francês. Depois de fixar-lhe o nome - Henrique Raymundo des Genettes, e não Desgenettes - ressalta que foi um dos mais esforçados e brilhantes pioneiros da nossa civilização. E enumera-lhe os feitos: "formado pela "Academia de Medicina de Brest", depois de prestar grandes serviços ao exercito francês, em Marrocos, e depois de servir como farmacêutico na "Fragata Minerva", veio para o Brasil, estabelecendo-se sucessivamente, no Rio de Janeiro, em Ouro Preto, em Araxá e na Bagagem (Estrela do Sul). Tomou parte na revolução liberal mineira chefiada por Teófilo Otoni, lutando, ardorosamente, no decisivo combate de Santa Luzia, em 1842, contra as forças legais, comandadas pelo ínclito Caxias". Seguem-se diversas outras passagens da vida do inquieto esculápio, pelas quais podemos deduzir que a impressão que ele acusou a Taunay não é verdadeiramente a que se deve conservar da sua personalidade. Confesso que lhe desconhecia o nome, porque de fato tenho lido parece coisa a respeito da história do Triângulo Mineiro. A obra mais minuciosa que deve haver sobre o assunto é um grosso volume que esteve em manuscrito em meu poder durante dois dias, de Hildebrando Pontes; mas o tempo não era suficiente nem para ler a epígrafe dos capítulos e não me foi confiado senão para avaliar o número de páginas impressas, nunca foi editado e talvez que não exista mais, apesar do mérito do historiador que gozava o saudoso uberabense.
Informa-nos Mendonça que des Genettes fundou o primeiro jornal da região, "O Paranaíba", que circulou no dia 1 de outubro de 1879. Só por isto já mereceria o nosso apreço e de certa forma, pondo de lado a circunstância de ter sido estrangeiro, justifica a sua inclusão entre os patronos da Academia de Letras do Triângulo Mineiro.
O folheto de José Mendonça, vazado na sua linguagem clara e escorreita, é uma preciosa fonte de detalhes históricos que a gente lê com sofreguidão e com proveito.
Lycidio Pes
Jornal "Correio de Uberlândia", 12 de maio de 1964
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